A revista The Economist traz na capa desta semana uma ilustração do Cristo Redentor com uma máscara de oxigênio. A imagem sintetiza uma reportagem especial cujo título pode ser traduzido por A década lúgubre do Brasil (no original, “Brazil’s dismal decade”). No entender da publicação, “Jair Bolsonaro não é a única razão pela qual seu país está em uma vala”. E os motivos que colaboram para o rápido declínio da nação (que hoje tem uma economia mais fraca do que há uma década, desemprego recorde de 14,7% e um assustador número de vítimas de Covid-19) estaria em parte no sistema eleitoral e político que cria governos mais interessados em servir a si mesmos que ao público. Segundo a revista, os adversários do Messias na eleição de 2022 “deveriam oferecer soluções em vez de espalhar nostalgia”. Isso porque o sucessor “herdará um país danificado e dividido”. A conclusão: “Infelizmente, a podridão é muito mais profunda do que um único homem.”
A argumentação da Economist é sólida, mas o diagnóstico peca ao atribuir a solução dos problemas às reformas, ainda que necessárias, e à capacidade de liderança de um presidente. O Brasil poderia estar ainda pior se não fossem as iniciativas de empresários e ONGs que criam redes de proteção social onde o governo não chega. Um exemplo é o Transforma Brasil, que acaba de lançar uma frente nacional de combate à fome em parceria com o WFP, o Programa Mundial de Alimentos da ONU. A “Missão Alimentar” terá como embaixador o empresário Rony Meisler, CEO do grupo Reserva. Ele será o responsável por abrir diálogo da ação com a iniciativa privada.
Segundo dados do Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil, da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar (Rede Penssan), 116,8 milhões de brasileiros não têm acesso pleno e permanente a alimentos. A iniciativa receberá doações em dinheiro e de alimentos não perecíveis em pontos de coleta da plataforma. Em 2020, o Fundo Transforma Brasil arrecadou mais de R$ 31 milhões para financiar a alimentação de mais de 400 mil famílias em todo o território nacional.
Se a fome já é uma triste realidade para milhões de brasileiros, o risco de um novo apagão de energia decorrente da atual crise hídrica pode agravar esse quadro. Segundo o Radar Agro, elaborado pelo Itaú BBA e divulgado na quinta-feira (3), “Especificamente no setor agropecuário, os danos já vêm sendo observados há meses, desde o atraso no desenvolvimento das culturas perenes”. Café, laranja, milho, cana-de-açúcar e feijão aparecem como algumas das culturas prejudicadas, assim como a pecuária de leite e de corte.
Em resumo, a seca, que já elevou o custo da eletricidade para os brasileiros, tende a encarecer diretamente os alimentos. É por isso que iniciativas como a Missão Alimentar precisam ser apoiadas por quem pode fazer mais pelos milhões de brasileiros afetados pela pandemia. Ajudar os mais vulneráveis se tornou decisivo para que o País não mergulhe em sua pior tragédia social, com fome, sem luz e sem saúde. Celso Masson
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