Fóssil esquecido em coleção no Brasil revela formiga mais antiga conhecida

Um fóssil quase esquecido, descoberto em uma coleção de museu no Brasil, revelou o mais antigo exemplar de formiga conhecido pela ciência, segundo uma nova pesquisa.
A formiga pré-histórica viveu entre os dinossauros há 113 milhões de anos — vários milênios antes das espécies encontradas anteriormente — e tinha uma forma incomum de matar suas presas.
Anderson Lepeco, pesquisador do Museu de Zoologia da Universidade de São Paulo, disse que encontrou o espécime “extraordinário” em setembro de 2024, enquanto examinava uma coleção de fósseis armazenada no próprio museu.
O museu possui uma das maiores coleções de insetos fossilizados do mundo e abriga espécimes oriundos da Formação Crato, no nordeste do Brasil — um depósito geológico famoso por sua preservação excepcional de fósseis.
Preservado em calcário, o inseto extinto recém-descrito é o que se conhece como uma “formiga do inferno”, membro de uma subfamília chamada Haidomyrmecinae, que viveu durante o período Cretáceo, entre 66 milhões e 45 milhões de anos atrás, e não está relacionado a nenhum vivo atualmente, segundo um estudo publicado nesta quinta-feira (24) na revista Current Biology.
A espécie fóssil, batizada de Vulcanidris cratensis, possuía mandíbulas semelhantes a foices, que provavelmente usava para prender ou empalar suas presas.
“Fiquei chocado ao ver aquela projeção estranha na frente da cabeça desse [inseto]”, disse Lepeco, autor principal do estudo. “Outras formigas do inferno já haviam sido descritas com mandíbulas incomuns, mas sempre como espécimes preservados em âmbar.”
É raro encontrar insetos preservados em rocha. Outras formigas do inferno do período Cretáceo foram encontradas preservadas em âmbar da França e de Mianmar, mas datam de cerca de 99 milhões de anos.
O fato de que uma formiga do inferno já vivia antes disso, no que hoje é o Brasil, indica que esses insetos já estavam amplamente distribuídos pelo planeta desde os primeiros estágios de sua evolução, segundo os autores do estudo.
A descoberta lança luz sobre como as formigas evoluíram durante o início do Cretáceo, um período de mudanças significativas. Ela também oferece pistas sobre características incomuns de espécies desse período que não sobreviveram à extinção em massa que pôs fim à era dos dinossauros, disseram os pesquisadores.

Características anatômicas perdidas no tempo
Hoje, as formigas são um dos grupos de insetos mais visíveis e abundantes do planeta, encontradas em todos os continentes, exceto na Antártica, conforme apontado pelo estudo.
No entanto, nem sempre foram dominantes. Elas evoluíram no final do período Jurássico e início do Cretáceo, há cerca de 145 milhões de anos, quando os ancestrais das formigas se separaram do mesmo grupo que deu origem às vespas e abelhas.
Só após o impacto do asteroide que levou dinossauros e outras espécies à extinção, há 66 milhões de anos, as formigas se tornaram os insetos mais comuns encontrados no registro fóssil, de acordo com o estudo.
O fóssil é uma “grande descoberta”, afirmou Phil Barden, professor associado do Instituto de Tecnologia de Nova Jersey que estuda a história evolutiva dos insetos.
“Essa nova descoberta agora representa a formiga mais antiga conhecida, estendendo o registro fóssil conhecido em cerca de dez milhões de anos”, disse Barden, que não participou do estudo, por e-mail.
“Embora fósseis de formigas sejam descritos desde o século XIX… Até agora, não estava claro se a ausência delas com mais de 100 milhões de anos se devia ao fato de que elas não existiam ou se simplesmente não estavam preservadas nos depósitos onde as pessoas procuravam”, acrescentou.
A espécie recém-identificada também possuía algumas características semelhantes às de vespas, o que indica a ancestralidade comum entre os dois grupos. Por exemplo, as asas da formiga tinham muito mais veias do que as das formigas atuais, disse Lepeco.
Imagens feitas com microtomografia computadorizada — uma técnica de imagem 3D que utiliza raios X para visualizar o interior da formiga — revelaram que o inseto estava estreitamente relacionado a outras formigas do inferno conhecidas apenas por fósseis de âmbar birmanês.
O que mais chamou atenção na formiga foram suas características anatômicas incomuns. As formigas modernas possuem mandíbulas que se fecham lateralmente — de um lado para o outro. No entanto, essa formiga possuía mandíbulas em forma de foice que se projetavam para frente, paralelas à cabeça e próximas aos olhos, segundo os pesquisadores descreveram no estudo.
“Podia funcionar como uma espécie de empilhadeira, movendo-se para cima”, explicou Lepeco por e-mail, ao descrever como a formiga caçava outros insetos extintos.
“A morfologia intrincada sugere que mesmo essas formigas mais antigas já haviam desenvolvido estratégias predatórias sofisticadas, significativamente diferentes das de suas contrapartes modernas”,concluiu Lepeco. Este conteúdo foi originalmente publicado em Fóssil esquecido em coleção no Brasil revela formiga mais antiga conhecida no site CNN Brasil.
COMENTÁRIOS